quarta-feira, 5 de outubro de 2011

AZULEJOS PUBLICITÁRIOS


Dói-me ver o comércio de produtos da terra expostos displicentemente nas bermas das estradas. Sol intenso, poeiras em remoinho, gases dos escapes automóveis, papéis e plásticos voando e que mais? Água, instalações sanitárias ou sabão, só na concorrência estabelecida em imóveis. O comércio nas bermas tem comerciantes ambulantes de profissão (a não confundir com pequenos produtores locais que esporadicamente tentam vender à porta alguns dos seus mimos) e clientes motorizados. Mas a publicidade destes estabelecimentos não engana ninguém. Em papelão ou numa qualquer tábua, travada por pedras igualmente toscas, impera o "Vendo batata cerejas morangos melão e ...frutas" impresso à trincha, em letras desiguais em plano inclinado. As barracas suportadas por meia dúzia de estacas, estão naquele tem-te, não caias, cobertas a plástico ou com restos de encerado. A suposta pobreza do comercio ambulante explica a improvisação disto tudo. E a preferência dada pela clientela, como se explica? Displicência, apenas?
 Atavismo. Num dos sentidos: excessivo apego aos valores herdados da cultura tribal. 


Não frequentei nem podia frequentar, pela distância, qualquer dos estabelecimentos comerciais referenciados pelos dois conjuntos de fotografias de hoje tiradas no centro histórico de Abrantes. Não sei qual a qualidade dos produtos que passaram ou passam por ali. Mas sei seguramente que os donos destas obras ao encomendá-las, tinham-se e tinham os clientes em alta estima. Só podia ser. A nobreza dos materiais escolhidos, a disposição da mensagem, a regularidade das linhas, todo o exterior significava (e faço votos que ainda mereça significar) o interior: confiança.


Na época da imperativa segurança alimentar vigiada da ASAE (Autoridade de Segurança Alimentar e Económica) coexistem  em Portugal vários normativos que condicionam o comércio de produtos alimentares. Basicamente o legal (o do fundamentalismo odioso das leis abstractas) e o herdado (prático e ajustado). O mais efectivo é este último porque conta na sua aplicação prática com a colaboração passiva de uma parte significativa dos consumidores que - lamento ter de o dizer, mas sem ofensa - ali, de algum modo, se sentem "em casa". 


 Um ambiente adequado e esteticamente acolhedor, (com ou sem azulejo) exprime o desígnio de bem receber. Quando expostos com gosto, também  os bons produtos da terra  exprimem a dignidade do trabalho da sua produção e comércio e o respeito pela humanidade do consumidor.

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