sábado, 7 de fevereiro de 2015

GEADA (FROST, GIVRE, HELADA, GELATE)


   Seguíamos alegremente de bicicleta, encurtando caminho pelos trilhos estreitos do pequeno bosque de pinhal e mato. Era inverno e a primeira aula tinha início às 9 horas da manhã. As geadas eram frequentes. Mobilizado o parco roupeiro, o frio não nos apanhava de moral sofrida.  Cedo aprendemos a tirar partido das condições de tempo. E como não reparar nas modificações da paisagem? Geralmente distraídos, não ficávamos indiferentes às composições das teias de aranha evidenciadas pelo brilho das contas de orvalho. Não: não víamos nelas as armadilhas discretas, obra de caçadores sinistros e implacáveis.  Era a complexidade e simetria das formas e o surpreendente enfeite de pérolas que despertava a atenção.


Hoje, à mesma hora matutina, não me aventurarei para além dos limites do jardim. 


Não encontrarei a sofisticação da rede de armadilhas capazes de deter um besouro em pleno voo sem danos irreparáveis. Mas o solo saturado das chuvas de há dias, vai libertando a água,  sob a forma de vapor de água. Restos de madeira também impregnados de humidade pela exposição ao tempo, são um suporte possível. 


As temperaturas abaixo dos zero graus centígrados e uma imperceptível aragem modelam cristais brancos da geada. 


Demasiado efémeras, cedo se diluirão com a incidência directa dos primeiros raios de sol. Labirinto de formas: qual a chave?

Fotos de 5 de Fevereiro de 2015.

4 comentários:

  1. Primeiro tem que se saber se há porta de saída (pode estar inacessível). "Sou um labirinto em busca de uma porta de saída" - Vinícius de Moraes.
    Depois, talvez valha a pena encontrar a chave… Que, como diz, poderá ser um raio de sol.
    Jinho

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    1. MARIA HELENA VIEIRA DA SILVA
      OU O ITINERÁRIO INELUTÁVEL

      Minúcia é o labirinto muro por muro
      Pedra contra pedra livro sobre livro
      Rua após rua escada após escada
      Se faz e se desfaz o labirinto
      Palácio é o labirinto e nele
      Se multiplicam as salas e cintilam
      Os quartos de Babel roucos e vermelhos
      Passado é o labirinto: seus jardins afloram
      E do fundo da memória sobem as escadas
      Encruzilhada é o labirinto e antro e gruta
      Biblioteca rede inventário colmeia –
      Itinerário é o labirinto
      Como o subir dum astro inelutável –
      Mas aquele que o percorre não encontra
      Toiro nenhum solar nem sol nem lua
      Mas só o vidro sucessivo do vazio
      E um brilho de azulejos íman frio
      Onde os espelhos devoram as imagens

      Exauridos pelo labirinto caminhamos
      Na minúcia da busca na atenção da busca
      Na luz mutável: de quadrado em quadrado
      Encontramos desvios redes e castelos
      Torres de vidro corredores de espanto

      Mas um dia emergiremos e as cidades
      Da equidade mostrarão seu branco
      Sua cal sua aurora seu prodígio.

      SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN
      Obra Poética III. 4ª Ed. Lisboa: Editorial Caminho.

      c/ beijinhos, Vítor.

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  2. A verdade é que a geada tem a sua beleza. Transforma plantas, terra, galhos, em esculturas de rara beleza. E só este ano é que me apercebi realmente disso. Talvez por já ter geado tanto...
    Gostei muito das fotos, apanhou bem essas esculturas geladas :)
    Bom fim de semana!

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    1. Celebrar a beleza, nem sempre acontece. Como tudo na vida, requer condições. De entre elas há uma condição necessária: abertura, sensibilidade, acolhimento do valor da beleza. Afinal, gostar (como o odiar) também se aprende. Agradeço a visita. Volte sempre. Cumprimentos, vítor.

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