Um amigo da minha maior estima, conta com muita graça a história, realmente acontecida, de quem chamou a casa um profissional para resolver um problema não especialmente transcendente de canalização. O homem lá apareceu, de fato macaco e malinha de mão. Ás tantas debatia-se já com o mais fundo da mala, remexendo e tornando a remexer, quando o dono da casa percebeu que ele não encontrava a chave adequada a determinada peça. Solícito, apresentou então ao atónito canalizador um inumerável arsenal de ferramentas próprias que nem a mais vasta montra do ramo conteria. Fascinado pelas soluções do tipo faça-você mesmo, dificilmente resistia á sua aquisição mesmo que na prática nunca viesse a utilizá-las, o que valeu logo ali o comentário do canalizador: oh homem, com este material eu era capaz de abrir um estabelecimento!
Vem isto a propósito do exercício das artes da sistemática vegetal por um curioso que sou. Quando ousamos entrar no conhecimento de uma área tão sofisticada, respaldados na acessibilidade da mais vasta informação, mas partindo do horizonte manifestamente curto de três anos de lições de botânica (3º a 5º ano do liceu), estamos sujeitos aos mais imprevistos equívocos e, pior ainda, a induzir outros a neles confiar como verdades.
(Pode então concluir-se que Portugal começou por não existir...)
(Pode então concluir-se que Portugal começou por não existir...)
No passado dia 27, quinta-feira, publiquei duas fotos que recolhi de passagem, atraído mais uma vez pelo exotismo e beleza das flores de uma planta desconhecida, com a decidida vontade de me aplicar até alcançar a sua identificação. Normalmente, a observação da flor chega para concluir nesse sentido, com segurança. Nem sempre!
Pois quando cheguei à incarvillea, gritei eureca! De facto a semelhança com a flor das fotos é manifesta. Mas era ainda cedo demais e a conclusão é errada, vejo agora. Devo a correcção do equívoco á atenção e generosa iniciativa de um leitor que se deixa identificar pela referência ao seu portal (http://faroleco.blogspot.pt). No seu comentário áquela página diz, na forma muito elegante duma interrogação, tratar-se da padronea ricasoliana. Tem toda a razão.
De facto, podranea ricasoliana e incarvillea, pertencem á mesma família das bignoniaceae. Estive perto! Mas focara a atenção sobretudo na flor. E aqui tinha de ir mais longe. Comparando: enquanto a podranea é uma liana, de caule lenhoso, já a incarvillea é de caule mole, uma herbácea. Esta alcança 30 centímetros de altura ou pouco mais. Já o tronco da podranea pode alcançar os dois metros e os lançamentos errantes das hastes, circulares e flexíveis, podem ir aos dez metros pelo que a planta tem de ser fortemente suportada!
Também se distinguem pela folhagem. As folhas da incarvillea são profundamente recortadas parecendo as dos fetos. As da podranea são compostas e opostas, com um único fólio no final do eixo. Finalmente a flor: se tivesse prestado melhor atenção veria que a incarvillea apresenta as flores em rácemos terminais acima da folhagem e são em geral de cor majenta ou cor de rosa-malva com amarelo e púrpura no interior do tubo e a da podranea é uma inflorescência terminal, de cálice campanulado e corola em cor de rosa muito ténue, com marcas no interior de cor majenta.
Sobre estes temas e outros ligados ao mundo vegetal, poderá acompanhar com vantagem (http://faroleco.blogspot.pt/2012/09/sete-leguas.html).
Renovo os meus agradecimentos ao generoso e atento leitor e as desculpas pelo erro.
Olá Vítor,
ResponderEliminarEu também não tenho qualquer formação em Botânica ou nas ciências envolventes. Movo-me pela curiosidade e nem sempre consigo alcançar os objetivos pretendidos, porque este mundo das plantas é enorme e complexo.
Por isso, quando comentei foi só com o intuito de ajudar... que é aquilo que eu também peço que me façam! Pois, só assim podemos continuar a nossa aprendizagem...
Um grande abraço
Olá,
ResponderEliminarmeu caro. Espírito de ajuda desinteressada tem um valor absoluto mas não parece ser assim tão comum que não mereça ser sublinhado. Nesta área que parte da capacidade de encantamento com a beleza natural mas que não fica pelo pasmo e, ao contrário, tenta uma compreensão mais funda dos fenómenos, pode parecer ocioso perder tempo com pretendentes a iniciados e o normal é "fazer caixinha" com os conhecimentos. Porque é que "o atrevido" não há-de ficar pela comoção estética e deixar o aprofundamento dos temas para especialistas? É certo que nós usamos do conhecimento de outros. Mas quem o não faz a começar pelos mais prestigiados mestres? Quem não tateia, quase como um sonâmbulo, à procura de mais verdade? Quem é tão genuinamente original que prescinda dos resultados já alcançados por outros? Por tudo, relevo o seu gesto "só com o intuito de ajudar", o agradeço e me sinto em comunhão. Um abraço.